Órgão Consultivo

Categoria: Informações em Processos de Consulta
Número:113/2009
Data da Aprovação:06/19/2009
Assunto:Comodato
Telecomunicação
Tratamento Tributário


Nota Explicativa :
Nota: " Os documentos contidos nesta base de dados têm caráter meramente informativo. Somente os textos publicados no Diário Oficial estão aptos à produção de efeitos legais."

Texto
INFORMAÇÃO Nº 113/2009 – GCPJ/SUNOR

....., empresa estabelecida na ...., inscrita no CNPJ sob o nº .... e inscrita neste Estado como substituto tributário sob o nº ...., por seu estabelecimento localizado na ....., inscrito no CNPJ sob o nº...., formula consulta sobre o tratamento tributário conferido nas remessas a este Estado de equipamentos necessários para a recepção de sinais de TV por assinatura pelos seus assinantes localizados neste Estado.
A Consulente informa que tem por principal objeto a prestação de serviços de telecomunicações na modalidade de televisão por assinatura por meio de satélite, denominada Direct-To-Home (DTH) modalidade de serviços especiais de telecomunicações, regulamentada pelo Decreto nº 2.196/97 e por outros atos normativos expedidos pela Agência Nacional de Telecomunicações –ANATEL.
Noticia que o seu centro de geração de sinais está localizado no Estado de São Paulo, sendo a titular dos direitos de transmissão de programas para o território brasileiro. Por conta disso, contrai com os assinantes o vínculo jurídico que tem por objeto a transmissão, o que é feito através de sua sede, também no Estado de São Paulo.
Esclarece que, de acordo com o modelo de negócio de remessa em comodato, o cliente (assinante) recebe um equipamento decodificador (IRD), o qual compõe o sistema necessário para a recepção dos sinais de DTH, e formaliza a adesão por intermédio da assinatura de um contrato de prestação de serviços.
Explica que as operações que realiza com seus parceiros comerciais estabelecidos neste Estado consistem em operações de empréstimo, que por sua própria natureza não estão compreendidas no campo de incidência do ICMS. Pelo que junta cópias de contratos de comodato firmados com alguns parceiros localizados neste Estado.
Aduz que a fiscalização deste Estado entende que as remessas em regime de comodato caracterizam-se como venda mercantil, mas que, no entanto, esta caracterização não é possível, em razão da natureza da operação (remessa em comodato), como também em razão de os bens estarem contabilmente registrados como “ativo permanente” da consulente.
Ressalta que as Notas Fiscais de remessa dos equipamentos são destinadas a contribuintes (parceiros) regularmente inscritos, nas quais são mencionados os seus endereços, a descrição dos bens e os dispositivos regulamentares que justificam a não incidência do ICMS.
Desta maneira, entende que não há quaisquer indícios de inidoneidade das Notas Fiscais de remessa em comodato realizadas aos seus parceiros comerciais neste Estado, visto que não envolve, de forma alguma, “mercadorias”, nem se verificam negócios de compra e venda que justifiquem a exigência do ICMS.
Pondera que a apreensão de equipamentos dificulta a prestação de serviços neste Estado, em face da impossibilidade de os assinantes receberem os sinais DTH, reduzindo assim o número de assinantes e por conseqüência o ICMS a ser recolhido pela prestação de serviços de comunicação.
Informa que o número de assinantes da .... neste Estado é de 23.444, que representa 62% dos serviços de TV por assinatura aqui prestados. Noticia, ainda, que o seu recolhimento de ICMS sobre prestação de serviços de comunicação resultou no valor aproximado de R$ 1,6 milhão no ano de 2008 (em média R$ 140 mil por mês).
Com base nos números acima demonstrados, faz as seguintes conclusões:
a) a Consulente tem significativa representatividade no mercado de TV por assinatura neste Estado;
b) a base do seu recolhimento do ICMS é a remuneração decorrente da prestação de serviços de comunicação (e não a suposta incidência do imposto na remessa de equipamentos que compõem o seu ativo imobilizado).
Comenta que em atendimento a requerimento apresentado em 16.05.2007 foi editado o Decreto nº 514, de 17/07/2007, alterando a redação do artigo 4º, inciso XVIII, do Regulamento do ICMS, para exclusão da exigência de devolução no prazo de 120 dias, nas operações de comodato.
Reclama que mesmo após a alteração na legislação o fisco mato-grossense mantém a exigência do prazo para a devolução dos equipamentos remetidos em comodato em 120 dias.
Ao final solicita a emissão de instrução e/ou norma especialmente dirigida aos órgãos fiscalizadores de Mato Grosso, determinando a devida aplicação do inciso XVIII do artigo 4º, do RICMS/MT, às remessas de equipamentos para a prestação de serviços de TV por assinatura via DTH, da forma que atualmente se encontra redigido, ou seja, reconhecendo a operação de remessa em regime de comodato, independente da devolução dos equipamentos no prazo de 120 dias, sem a cobrança de ICMS sobre os bens cedidos.
A consulente junta ao presente processo os seguintes documentos:
1) cópias de contratos de comodato firmados com seus parceiros comerciais localizados neste Estado (fls. 43 a 46);
2) cópias de Notas Fiscais de remessa em comodato dos equipamentos para as empresas (parceiros comerciais) localizadas em Mato Grosso (fls. 48 a 52);
3) cópia de parte de seu balancete analítico que demonstra os equipamentos registrados no seu ativo fixo (fl. 47);
4) cópias de Termos de Apreensão e Depósito emitidos pelo fisco mato-grossense em nome dos seus parceiros comerciais referente a cobrança antecipada do imposto, nos quais consta como infração a Resolução 029/99-CGSIAT - Contribuinte com débitos em atraso no Conta Corrente Fiscal (fls. 40 a 42).

É a consulta.

Para a análise da presente consulta, faz-se necessário que se trace algumas considerações sobre o instituto do comodato iniciando-se pelo que prescreve o Código Civil (Lei nº 10.406/2002):


Depreende-se, das regras estabelecidas para o referido instituto, que para caracterizá-lo o contrato deve conter os seguintes requisitos:
a) gratuidade - o comodato é contrato essencialmente gratuito. O comodante não pode estipular qualquer espécie de retribuição pela cessão de uso da coisa;

b) não fungibilidade - a coisa emprestada não pode ser substituída por outra no ato da devolução;

c) tradição - o comodato só se realiza com a entrega do objeto. Enquanto não ocorrer a transferência da posse do bem, não há comodato;

d) temporalidade - a coisa emprestada deve ser devolvida após algum tempo. Seu uso há de ser temporário, do contrário seria doação;

e) unilateralidade - o comodato cria obrigações apenas para o comodatário – de conservar e de restituir o bem.

No que tange à fungibilidade, o Código Civil Brasileiro, no seu artigo 85, define bens fungíveis como: “São fungíveis os móveis que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade”. Ou seja, tais categorias de bens não podem figurar como objetos do contrato de comodato.
Ainda, no tocante à fungibilidade, leciona Maria Helena Diniz que: “os bens fungíveis são os que podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade, e os bens infungíveis são os que, pela sua qualidade individual, têm um valor especial, não podendo, por este motivo, ser substituídos sem que isso acarrete a alteração de seu conteúdo”. (Código Civil Anotado, 9ª ed. - São Paulo: Saraiva, 2003, p. 101).
No mesmo sentido, leciona o professor José Carlos Moreira Alves “as coisas infungíveis são aquelas em que se leva em consideração sua própria individualidade, e que, por conseguinte, não podem ser substituídas por outras. Diferem das coisas fungíveis, que são consideradas pelo seu gênero e não pela sua individualidade. Em outras palavras, são as coisas que são passíveis de serem medidas e pesadas, sendo que, por esta razão, podem ser substituídas por outras da mesma espécie, qualidade e quantidade”. (apud. Teresa Ancona Lopez. Comentários ao Código Civil: parte especial: das várias espécies de contratos, vol. 7 (arts.565 a 652): Coord. Antonio Junqueira de Azevedo – São Paulo: Saraiva, 2003 p.85).
Portanto, como se observa, o comodato é um contrato unilateral, a título gratuito, pelo qual alguém entrega a outrem coisa infungível para ser usada temporariamente e depois restituída.
A legislação tributária estadual, por sua vez, prevê a não incidência do imposto nas operações realizadas a título de comodato desde que contratados por escrito, conforme se infere do art. 4º, inciso XVIII, do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 1.944, de 06/10/89:


Verifica-se, portanto, que, além do cumprimento dos demais requisitos do instituto do comodato, para não haver a incidência do ICMS sobre a operação a contratação deve ser por escrito.
Claro está que com a alteração na redação do inciso XVIII do artigo 4º do Regulamento do ICMS, introduzida pelo Decreto nº 514, de 17/07/2007, foi suprimida a exigência de devolução no prazo estabelecido anteriormente, qual seja de 120 dias.
Assim, por força do artigo 4º, inciso XVIII do Regulamento do ICMS, não incide o imposto nas operações que configuram comodato. Todavia, vale ressaltar que este instituto tem suas características determinadas no direito civil e que devem ser observadas para que seja configurado.
No que concerne aos termos da presente consulta, cabe, inicialmente, anotar que não há informação quanto ao tipo de documento que acoberta a saída do equipamento do estabelecimento do parceiro comercial até o local de instalação para o assinante. Há somente a afirmação por parte da consulente de que a adesão é formalizada por intermédio da assinatura de um contrato de prestação de serviços.
Todavia, a consulente não juntou cópia do mencionado contrato de prestação de serviços.
Em pesquisa ao endereço eletrônico da Consulente foi localizado o “Contrato de Adesão” (documento anexado às fls 63 a 75), no qual constam as condições gerais de assinatura. No referido contrato o comodato é tratado no item 10, sendo que seus sub-itens assim mencionam:

Assim, pelo que se pode inferir dos fatos relatados na consulta, bem como dos termos do “Contrato de Adesão”, acima transcritos, os equipamentos são de propriedade da prestadora de serviços de TV por assinatura (Consulente), a qual já os cedeu em comodato para empresas comerciais neste Estado, que os entregam aos assinantes mediante contrato de adesão firmado com a Consulente.
Ocorre que, uma das condições para a realização de comodato é a de que o bem seja de propriedade do comodante, isto é, que o bem integre o seu patrimônio. No presente caso, as empresas comerciais estabelecidas neste Estado não são proprietárias dos bens, logo, não há como fazer novo contrato a esse título com os assinantes.
Neste caso, da leitura do referido Contrato de Adesão, verifica-se que a consulente, proprietária dos bens, pretende cedê-los em comodato para duas pessoas distintas ao mesmo tempo, primeiro para os seus parceiros comerciais e posteriormente para os seus assinantes.
Com relação aos parceiros comerciais da Consulente, em consulta ao Sistema de Informações Cadastrais desta Secretaria de Estado de Fazenda (documentos anexados às fls. 61 e 62), constatou-se não se tratar de empresas de assistência técnica, mas sim de estabelecimentos cadastrados tão-somente em CNAE de comércio atacadista ou varejista de aparelhos eletrônicos.
No caso exposto, a consulente vem procedendo a remessa de equipamentos para empresas comerciais estabelecidas neste Estado, em volume que caracteriza intuito comercial, dessa forma torna-se devido o imposto na forma do artigo 1º, inciso I, c/c artigo 10 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 1.944, de 06/10/89:

Além disso, nas Notas Fiscais cuja natureza da operação é remessa em comodato, apresentadas pela Consulente às fls. 48 a 52, os produtos não são identificados por número de série, deixando, portanto, de atender ao requisito da não fungibilidade.
Cabe ainda ressaltar que, conforme se depreende do item 10.1 do Contrato de Adesão, nem todos os equipamentos são cedidos em comodato, em caso de restrição ao crédito do assinante este somente poderá aderir mediante compra dos equipamentos, hipótese em que a Nota Fiscal de venda deverá ser emitida.
De outro modo, para estar albergada pela não incidência, prevista no art. 4º, inciso XVIII, do Regulamento do ICMS, acima reproduzido, a operação de comodato deve ser realizada por meio de contrato escrito, diretamente entre a pessoa que tem o domínio do bem e o usuário, sendo que o bem emprestado deve se destinar ao uso do comodatário, para posterior restituição ao proprietário do bem.
Dessa forma, na presente questão, para que a operação seja caracterizada como comodato, além do atendimento aos demais requisitos inerentes ao instituto, a Nota Fiscal de remessa em comodato deve ser emitida pela prestadora de serviços de TV por assinatura diretamente ao assinante mato-grossense.
Neste caso, a remessa do bem em comodato para este Estado deverá estar acompanhada dos seguintes documentos:
1 – contrato de comodato firmado entre a prestadora de serviços de TV por assinatura e cada um dos usuários mato-grossenses;
2 - Nota fiscal emitida pela prestadora de serviços de TV por assinatura para cada um dos usuários mato-grossenses, com natureza da operação “Remessa de bem por conta de contrato de comodato”, que além dos requisitos comuns aos documentos fiscais, deverá conter os dados que identificam o equipamento, quais sejam, o tipo ou modelo e o número de série de fabricação, bem como no campo “Informações Complementares” o número do contrato de comodato.
Por fim, após a aprovação da presente consulta deverá ser encaminhada cópia às seguintes unidades, para conhecimento.

    Superintendência de Informações do ICMS – SUIC
    Superintendência de Execução Desconcentrada – SUED
    Superintendência de Atendimento ao Contribuinte – SUAC

É a informação, ora submetida à superior consideração.

Gerência de Controle de Processos Judiciais da Superintendência de Normas da Receita Pública, em Cuiabá – MT, 17 de junho de 2009.

Marilsa Martins Pereira
FTE Matr. 167330012