Órgão Consultivo
Categoria:
Informações em Processos de Restituição
Número:
282/02-GLT
Data da Aprovação:
08/27/2002
Assunto:
Construção Civil
Diferencial Alíquota
Nota Explicativa :
Nota: " Os documentos contidos nesta base de dados têm caráter meramente informativo. Somente os textos publicados no Diário Oficial estão aptos à produção de efeitos legais."
Texto
Senhor Secretário:
A empresa acima nominada, estabelecida na Av. ......., nº ........., em Cuiabá/MT, inscrita no CNPJ sob o nº ........ e no Cadastro de Contribuintes do Estado sob o nº ......., solicita restituição de ICMS Diferencial de alíquota, que alega pago indevidamente, no valor total de R$ ......., referente aquisição de material de construção.
Discordando da exigência do referido imposto por parte desta Secretaria de Fazenda, a requerente expõe ainda o que segue:
1 – desenvolve suas atividades no ramo de construção civil, encontrando-se atualmente em fase de finalização da obra da nova sede do ......., localizado na Avenida ......, o que a levou a adquirir materiais de construção civil, junto a empresa ........., localizada no Estado de São Paulo;
2 – O imposto destacado nas Notas Fiscais, quando das aquisições dos referidos materiais, foi de 18%, exatamente por entender a empresa fornecedora que a adquirente da mercadoria é consumidora final dos produtos ali discriminados, no seu entendimento, não havendo diferencial de alíquota;
3
–
todavia, este não foi o entendimento desta Secretaria, no Posto Fiscal Flávio Gomes, ao conferir os materiais de construção, em 28/10/2001, descritos nas Notas fiscais nºs .... e ...., onde condicionou a liberação dos referidos materiais ao pagamento do ICMS Diferencial de alíquota.
Em matéria de direito, em síntese, reafirma discordar do entendimento da Fazenda, no que tange a cobrança do ICMS diferencial de alíquotas das empresas que atuam no ramo de construção civil, apresentando citações doutrinárias atinentes à matéria, e também os seguintes pontos:
1) a Constituição Federal ao definir o Sistema Tributário Nacional, determinou os limites e os conceitos, que não podem ser alargados ou diminuídos por qualquer lei que lhe complemente;
2) a relação entre empreiteiro e contratante de uma obra de construção civil, configura-se como uma obrigação de fazer, típica de contratos de prestação de serviço, que estão sujeitos à incidência do ISS, imposto este que é pago sobre o valor total da obra, aí incluídos o preço do material utilizado;
3) não há como sustentar que um contribuinte recolha aos cofres públicos dois impostos por um único fato jurídico praticado, isto é, ou bem se paga ISS ou se paga ICMS, querer as duas Fazendas receber cada uma o seu quinhão pela mesma atividade exercida é ilegal e fere direito constitucionalmente garantido ao contribuinte;
4) nas operações de compras constantes das Notas Fiscais em tela não há qualquer conteúdo mercantil, pois tais produtos jamais se destinaram ao comércio, pois foram adquiridos com uma finalidade específica, qual seja, serem utilizados na obra da construção do .......
Instruem o requerimento cópias dos seguintes documentos:
1) Contrato Social da empresa, constando que a sociedade tem como objetivo a construção civil, incorporação, terraplanagem, pontes, pavimentação, topografia e serviços correlatos, (fls. 10 a 18);
2) Notas Fiscais de compra de material de construção, de nºs. ..... e ......., emitidas pela empresa ..................., sediada em São Paulo-SP, respectivamente nas datas de ......O1 e .......01, (fls. 019 e 020);
3) Documentos de Arrecadação – DAR – MODELO 1 – AUT, com ICMS-Diferencial de alíquota no valor total de R$ 1.690,88, (fls. 021 a 023);
A Superintendência Adjunta de Informações Tributárias-SAIT, confirmou o efetivo ingresso nos cofres estaduais dos valores constantes dos referidos DAR, juntando os extratos correspondentes às fls. 26 a 28.
É o relatório.
Sobre o assunto, a extinta Assessoria Tributária, bem como a atual Gerência de Legislação Tributária, que lhe substituiu nas suas atribuições, tem reiteradamente manifestado o entendimento, que com as devidas atualizações, passa-se a expor:
Inicialmente, é de se trazer à colação os preceitos que norteiam a tributação dos prestadores de serviços, a começar pelo
Decreto-lei nº 406
, de 31 de dezembro de 1968, que, em seu artigo 8º, determina:
"
Art. 8º
- O imposto, de competência dos Municípios, sobre serviços de qualquer natureza, tem como fato gerador a prestação, por empresa ou profissional autônomo, com ou semestabelecimento fixo, de serviço constante da lista anexa.
§ 1º - Os serviços incluídos na lista ficam sujeitos apenas ao imposto previsto neste artigo, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias.
2º - O fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não especificados na lista fica sujeito ao imposto sobre circulação de mercadorias."
Examinando a Lista de Serviços remetida, já na redação conferida pela Lei Complementar nº
56
, de 15 de dezembro de 1987, verifica-se estarem nela arroladas as seguintes atividades, conforme
itens 32 e 34:
"(...)
32.
Execução
, por administração, empreitada e subempreitada, de
construção civil
, de obras hidráulicas e outras obras semelhantes e respectiva engenharia consultiva, inclusive serviços auxiliares ou complementares (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços, fora do local da prestação dos serviços que fica sujeito ao ICM).
(...)
34.
Reparação
,
conservação
e
reforma
de edifícios,
estradas
, pontes, portos e congêneres (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador dos serviços fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICM).
(...)."
A Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, que dispõe sobre o ICMS, determina:
"Art. 2º
- O imposto incide sobre:
(...)
V - fornecimento de mercadorias com prestação de serviços sujeitos ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, quando a lei complementar aplicável expressamente o sujeitar à incidência do imposto estadual.
(...)."
Conveniente observar que a aludida Lei Complementar não trouxe nova regra que alterasse o tratamento estabelecido entre os impostos estadual e municipal, ditado pelo Decreto-lei nº 406/68.
Respeitados os limites da competência estadual, a
Lei 7.098
, de 30 de dezembro de 1998, que consolidou normas referentes ao ICMS, ao definir o momento da ocorrência do fato gerador, estabelece:
"Art. 3º
- Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
(...
)
VIII - do fornecimento de mercadoria com prestação de serviços:
(...)
b) compreendidos na competência tributária dos municípios e com indicação expressa de incidência deste imposto, como definida em lei complementar;
(...)"
O Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 1.944, de 06 de outubro de 1989, por sua vez, detalha:
"Art. 2º
- Ocorre o fato gerador do imposto:
(...)
IX - no fornecimento de mercadorias com prestação de serviços compreendidos na competência tributária dos municípios e com indicação expressa de incidência do ICMS, como definida na lei complementar, a saber:
a) fornecimento de mercadorias
produzidas pelo prestador do serviço
,
fora do local da prestação do serviço
:
1) nos casos de execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, obras hidráulicas e outras obras semelhantes e respectiva engenharia consultiva, inclusive serviços auxiliares ou complementares;
2) nos casos de conservação, reparação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres;
(...)."
Por seu turno, cuidando da não-incidência, o artigo 4º do texto regulamentar dispõe:
"
Art. 4º
- O imposto não incide sobre:
(...)
XIV - as saídas de mercadorias de estabelecimento prestador de serviços a que se refere o artigo 8º do Decreto-lei Federal nº 406, de 31 de dezembro de 1968, na redação determinada pelo Decreto-lei 834, de 8 de setembro de 1969, constante da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987,
ressalvadas as hipóteses previstas nos incisos VIII e IX do artigo 2º deste regulamento
.
(...)."
Não é demais trazer à colação a definição de contribuinte, contida no artigo 10 do Regulamento do ICMS:
"
Art. 10
- Contribuinte é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize operação de circulação de mercadoria ou prestação de serviços descritos como fato gerador do imposto.
§ 1º - Incluem-se entre os contribuintes do imposto:
(...)
X -
o prestador de serviços compreendidos na competência tributária dos Municípios
,
e que envolvam fornecimento de mercadorias ressalvadas em lei complementar
;
(...)."
Ainda do RICMS, busca-se o disposto no artigo 21:
"
Art. 21
- Inscrever-se-ão no Cadastro de Contribuintes do ICMS, antes de iniciarem atividades:
I - as pessoas arroladas no artigo 10;
(...)
V - as demais pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que praticarem habitualmente, em nome próprio ou de terceiros, operações relativas à circulação de mercadorias;
(...)."
Além das disposições até aqui invocadas, estatuídas em artigos de caráter geral, o RICMS contém capítulo exclusivo normatizando as
Operações relativas à Construção Civil
(Capítulo III do Título VII do Livro I). Deste, incumbe transcrever:
"
Art. 426
Considera-se empresa de construção civil,
para fins de inscrição e cumprimento das demais
obrigações fiscais previstas neste regulamento
, toda pessoa, natural ou jurídica, que executar obras de construção civil ou hidráulicas, promovendo a circulação de mercadorias em seu próprio nome ou de terceiros.
§ 1º Entendem-se por obras de construção as adiante relacionadas, quando decorrentes de obras de engenharia civil:
I - construção, demolição, reforma ou reparação de prédios ou de outras edificações;
(...)
§ 2º O disposto neste capítulo
aplica-se também
aos empreiteiros e subempreiteiros, responsáveis pela execução da obra no todo ou em parte."
Art. 427
- O imposto
não incide
sobre:
I - a execução de obras por administração
sem fornecimento de material
;
II - o fornecimento de material
adquirido de terceiros
por empreiteiro ou subempreiteiro para aplicação na obra;
III - a movimentação de material a que se refere o inciso anterior, entre estabelecimentos do mesmo titular, entre estes e a obra ou de uma para outra obra;
IV - a saída de máquinas, veículos, ferramentas ou utensílios para prestação de serviço em obra, desde que devam retornar ao estabelecimento do remetente.”
Ressalva-se que o artigo 427 transcrito foi restabelecido no RICMS, com nova redação, através do Decreto nº 81, de 28 de março de 1995.
"
Art. 429
- O imposto será pago sempre que a empresa de construção promover:
I - saídas de materiais, inclusive sobras e resíduos decorrentes da obra executada, ou de demolição, quando destinados a terceiros;
II - a saída de seu estabelecimento,
de material de fabricação própria
;
III - a entrada de mercadoria importada do exterior;
IV - a
entrada
, no estabelecimento da empresa,
de mercadoria oriunda de outro Estado ou do Distrito Federal
destinada a consumo ou a ativo fixo
;
(...)
Parágrafo único - Nas hipóteses dos incisos IV e V a obrigação da empresa consistirá, afinal, em pagar o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual.”
A longa reprodução dos preceitos legais e regulamentares tem por escopo oferecer a sustentação para as conclusões que se seguirão.
O Decreto-lei nº 406/68, ao remeter, em seu artigo 8º, à sua anexa Lista, as hipóteses constitutivas do fato gerador do ISS, deixou a salvo do então ICM - hoje, ICMS - o fornecimento de mercadorias por empresas de construção civil, adquiridas de terceiros. A exclusão, vale destacar, está claramente explicitada no artigo 4º, inciso XIV do RICMS.
Por conseguinte a empresa que, atuando no ramo em tela, em regime de administração, empreitada ou subempreitada, não forneça mercadorias de fabricação própria, produzida fora do local da obra,
não configura
,
por esta atividade
,
contribuinte do imposto
.
O entendimento esposado é ratificado pelo § 1º do artigo 10 do RICMS, que, no que pertine ao prestador de serviços submetido ao imposto municipal, considera-o contribuinte do ICMS, quando também fornecer mercadorias ressalvadas em lei complementar (inciso X).
Prosseguindo na análise das indicações, há que se investigar os fundamentos da parcela do imposto devido a título de diferencial de alíquota.
A Carta Magna de 1988, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Emenda Constitucional nº 3, de 17 de março de 1993, preconiza:
"Art. 155 - Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
(...)
II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;
(...)
§ 2º - O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(...)
VII - em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á:
a)
a alíquota interestadual quando o destinatário for contribuinte do imposto
;
b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele;
VIII - na hipótese da alínea 'a' do inciso anterior, caberá ao Estado da localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual;
(...)."
Ocorre que, via de regra, as empresas do tipo em tela dedicam-se a mais de uma atividade - é comum estatutos sociais prevendo não só atividades em questão, mas também outras de natureza correlata, com submissão ao ICMS (fornecimento de mercadoria ressalvada em lei complementar) e, até mesmo, atos de comércio, senão em geral, pelo menos, de sobras e resíduos, como indicado no inciso I do artigo 429 do RICMS.
De sorte que, em tese, no desempenho de suas atividades, as empresas enumeradas nos §§ do artigo 426, praticam também fatos que lhes conferem a condição de contribuinte, ainda que em caráter excepcional.
Para a exigibilidade do diferencial de alíquota, é necessária a qualidade, mesmo que em potencial, de contribuinte do ICMS, mas não se perquire se a mercadoria vai ser destinada a atividade afeta a este imposto, ou não.
Uma vez contribuinte, a alíquota aplicável nas aquisições de outros Estados é a interestadual, ainda que o bem ou material seja empregado em prestação de serviço sujeita apenas ao ISS.
Daí a celebração do
Convênio ICMS 71/89
firmando o seguinte entendimento:
"Cláusula primeira - ... nas operações interestaduais de bens e mercadorias destinadas a empresas de construção civil, para fornecimento em obras contratadas que executem sob sua responsabilidade, e em que ajam, ainda que excepcionalmente, como contribuinte do imposto, aplica-se o disposto na letra 'a' do inciso VII e, se for o caso, no inciso VIII, do § 2º, do artigo 155 da Constituição Federal."
Os incisos IV e V do artigo 429 do RICMS, se tomados isoladamente, poderiam levar a concluir que a qualquer empresa impõe-se o recolhimento do diferencial de alíquota. A ilação é falsa. Os dispositivos hão que ser interpretados à luz dos demais, hierarquicamente superiores, que norteiam a matéria, sem perder a correlação com os incisos citados do artigo 2º do RICMS.
Por empresa, nos incisos em exame, deve-se entender apenas aquelas enquadradas na condição de contribuintes do ICMS - ainda, que, excepcionalmente, porém, contribuintes -, respeitando-se, portanto, os limites legais definidores do arquétipo do diferencial de alíquota.
Em não sendo contribuinte, isto é, dedicando-se exclusivamente a atividade sujeita ao ISS, não estaria, sequer, inscrita no Cadastro de Contribuintes do Estado,
não podendo
, então, apresentar-se como tal nas aquisições interestaduais.
Diante do exposto, conclui-se que as empresas de construção civil enquadram-se como contribuintes do ICMS, ainda que eventual, uma vez que tais empresas, via de regra desenvolvem atividades decorrentes da principal, que as tornam contribuintes de ambos os impostos (Municipal e Estadual), haja vista o fornecimento de mercadoria ressalvada em lei complementar ou as saídas de materiais, sobras e resíduos (inciso I do art. 429 do RICMS).
Por conseguinte, as empresas de Construção Civil enquadram-se, ainda que excepcionalmente, como contribuinte do ICMS, por realizarem mesmo que esporadicamente as operações descritas no artigo 429 do RICMS.
Vale salientar que o fato de a empresa fornecedora estabelecida em outra unidade da federação ter destacado o imposto aplicando-se a alíquota estabelecida para não contribuinte do ICMS, nas operações realizadas com a requerente, não impede este Estado de exigir a parcela do imposto devido a título de diferencial de alíquota que lhe foi constitucionalmente reservado. É justamente o que assevera o Convênio ICMS nº 71/89, que em momento algum foi declarado inconstitucional e do qual os Estados são signatários.
Por fim, propõe-se
indeferimento
do pleito.
É a informação, que se submete à superior consideração, com a ressalva de que os destaques apostos nos preceitos da legislação reproduzida inexistem no original.
Gerência de Legislação Tributária da Superintendência Adjunta de Tributação em Cuiabá-MT, em 12 de agosto de 2002.
Antonio Alves da Silva
FTE Matr. 387.6l0.014
De acordo:
Marilsa Martins Pereira
Gerente de Legislação Tributária
Dulcinéia Souza Magalhães
Superintendente Adjunta de Tributação