Órgão Consultivo

Categoria: Informações em Processos de Consulta
Número:186/2020 - CRDI/SUNOR
Data da Aprovação:08/26/2020
Assunto:Benefício Fiscal
Renúncia de Crédito
Aproveitamento Crédito


Nota Explicativa :
Nota: " Os documentos contidos nesta base de dados têm caráter meramente informativo. Somente os textos publicados no Diário Oficial estão aptos à produção de efeitos legais."

Texto
INFORMAÇÃO N° 186/2020 – CRDI/SUNOR

..., pessoa jurídica de direito privado, estabelecida no município de ... (... km de Cuiabá), Estado de Mato Grosso, na Rodovia BR ..., Km ... mais ... metros, Zona Rural, inscrita no CNPJ sob o n° ..., inscrição estadual n° ..., formula consulta sobre o alcance da renúncia aos créditos fiscais dos beneficiários do PRODEIC.

A consulente informa que:
(a) industrializa e comercializa couros de origem animal;
(b) é beneficiária do Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial do Estado de Mato Grosso (Prodeic), fruindo crédito presumido de 60% do valor do ICMS incidente nas vendas interestaduais de couro wet blue, conforme cláusula quarta do protocolo de intenções firmado com o Estado de Mato Grosso;
(c) o referido protocolo de intenções (não juntado ao processo) é omisso quanto à renúncia de créditos fiscais de ICMS relativos à entrada de mercadorias no estabelecimento e na contratação de serviços; entretanto, ao final da consulta, expõe haver como contrapartida do benefício fiscal a vedação ao aproveitamento de todos e quaisquer créditos fiscais de ICMS relativos à entrada de mercadorias no estabelecimento ou decorrente de serviços por este tomados.

Isto posto, a consulente questiona:
(1) se em virtude da utilização do benefício fiscal do crédito presumido previsto no Prodeic, a vedação ao aproveitamento de quaisquer outros créditos, refere-se a todos os produtos e operações da consulente, ou, respeitando o princípio da não cumulatividade, a vedação se aplica somente às saídas beneficiadas pelo crédito presumido do ICMS (venda interestadual de couro wet blue);
A consulente entende que a vedação se aplica apenas às saídas beneficiadas pelo crédito presumido do ICMS (venda interestadual de couro wet blue), em função do princípio da não cumulatividade do ICMS.
(2) se poderá se apropriar de forma proporcional do crédito de ICMS referente às mercadorias exportadas.

A consulente entende que poderá, em função do disposto no artigo 21 da Lei Complementar n° 87, de 13 de setembro de 1996, e do artigo 124 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n° 2.212, de 20 de março de 2014.

Declara ainda a consulente que não se encontra sob procedimento fiscal iniciado ou já instaurado para apurar fatos relacionados com a matéria objeto da presente consulta, que as dúvidas suscitadas não foram objeto de consulta anterior já respondida, bem como que a matéria consultada não foi objeto de decisão proferida em processo administrativo já findo, em que tenha sido parte.

É a consulta.

Consultando os sistemas fazendários, verifica-se que a consulente:
(a) tem como atividade principal a prevista na CNAE n° 1510-6/00, curtimento e outras preparações de couro;
(b) é enquadrada no benefício fiscal: Prodeic investe couro Mato Grosso, desde 01/01/2020;
(c) é enquadrada no benefício fiscal: Prodeic investe Indústria alimentícia de origem vegetal e animal, desde 01/03/2020;
(d) fez opção pelo uso do diferimento do diferencial de alíquotas, relativo a entrada de bens no ativo imobilizado da empresa;
(e) efetuou a remissão e anistia sem migração, conforme previsto na Lei Complementar (estadual) n° 631, de 31 de julho de 2019.

Inicialmente, é importante analisar a posição do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema:

Firmou-se a jurisprudência do Plenário deste STF no sentido de que a vedação, pela legislação estadual, ao aproveitamento dos créditos do ICMS gerados pela entrada de insumos tributados, quando o contribuinte exerce, livremente, opção pela tributação das saídas mediante base de cálculo reduzida, não viola o princípio da não cumulatividade. Precedente: RE 584.023 AgR-EDv-AgR-segundo, rel. min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, DJE de 11-12-2015.
[AI 765.420 AgR-segundo, rel. p/ o ac. min. Rosa Weber, j. 21-2-2017, 1ª T, DJE de 4-8-2017.]

ICMS. (...) Situação peculiar. Regime alternativo e opcional para apuração do tributo. Concessão de benefício condicionada ao não registro de créditos. Pretensão voltada à permanência do benefício, cumulado ao direito de registro de créditos proporcionais ao valor cobrado. Impossibilidade. Tratando-se de regime alternativo e facultativo de apuração do valor devido, não é possível manter o benefício sem a contrapartida esperada pelas autoridades fiscais, sob pena de extensão indevida do incentivo.
[RE 248.182 AgR, rel. min. Joaquim Barbosa, j. 6-4-2010, 2ª T, DJE de 30-4-2010.]

Da leitura das decisões transcritas, verifica-se que é possível condicionar regimes ou benefícios fiscais à renúncia de créditos de ICMS.

Assim, se o contribuinte almejar (opção livre deste) determinado benefício que exija a renúncia a créditos fiscais, esta deverá ser obedecida.

Afinal de contas, crédito fiscal de ICMS é um direito disponível (do ponto de vista do contribuinte) e por consequência, o contribuinte poderá abrir mão de crédito fiscal de ICMS se tal ato (renúncia), em função do benefício obtido (regime de tributação ou benefício fiscal), lhe for favorável.

Entretanto, essa análise de mérito, em optar ou não a benefício fiscal ou regime de tributação que exija a renúncia de créditos fiscais, é feita exclusivamente pelo contribuinte, no momento em que adere, de forma livre e espontânea, ao tratamento diferenciado.

Na medida em que o próprio contribuinte optou pela renúncia aos créditos fiscais e que estes se tratam de direitos disponíveis (passíveis de renúncia), não há que se falar em violação ao princípio da não cumulatividade.

Ademais, o fato da origem do crédito fiscal a ser renunciado ser oriundo de insumos de mercadorias que foram exportadas é irrelevante.

A natureza jurídica do crédito fiscal do ICMS é a mesma, independentemente deste ter como origem: operações de exportação, bens do ativo imobilizado, operações comuns (internas ou interestaduais), etc.

Tudo se trata de crédito fiscal de ICMS em favor do contribuinte, todos com natureza de direito disponível e por esta razão passíveis de renúncia.

A legislação, por vezes, diferencia critérios para apropriação de créditos, para transferência de créditos, etc. Entretanto, tais diferenciações não atingem a natureza disponível do crédito fiscal.

Em síntese, crédito fiscal de ICMS é um direito à disposição do contribuinte para que este utilize da melhor forma (desde que prevista na legislação) possível para a sua atividade.

Feitos esses esclarecimentos iniciais, passa-se a avaliar o presente caso concreto.

(Questionamento n° 1) se, em virtude da utilização do benefício fiscal do crédito presumido previsto no Prodeic, a vedação ao aproveitamento de quaisquer outros créditos se refere a todos os produtos e operações da consulente, ou respeitando o princípio da não cumulatividade, a vedação se aplica somente às saídas beneficiadas pelo crédito presumido do ICMS (venda interestadual de couro wet blue);

Inicialmente, é necessário fazer algumas observações com relação ao escopo da consulta realizada:
(a) a presente consulta foi protocolada em 17/05/2019, ou seja, data em que estava em vigor o protocolo de intenções citado pala consulente;

É importante mencionar esse fato pois a LC n° 631, de 31 de julho de 2019, alterou a política de incentivos fiscais do Estado, revogando os protocolos de intenção vigentes até então (produziram efeitos até 31 de dezembro de 2020) e oferecendo aos contribuintes novas opções de benefícios fiscais.

(b) a consulente apenas cita que existe norma (ou o protocolo ora vigente) que lhe veda o aproveitamento de quaisquer créditos de ICMS como contrapartida de benefício fiscal em suas operações interestaduais com couro wet blue, entretanto não junta à presente consulta tal disposição normativa ou protocolo de intenções;

Dessa forma, consideraremos para fins da presente resposta, que exista tal vedação, ou que a consulente utilize determinado benefício fiscal que exija tal vedação.
Feitas as pertinentes limitações de escopo da resposta, passa-se a responder ao questionamento efetuado, a saber: o alcance da expressão renúncia ao aproveitamento de quaisquer créditos de ICMS.

Pois bem, a legislação tributária mato-grossense, em diversos dispositivos condiciona a fruição de benefícios fiscais à renúncia de créditos fiscais.

Vejamos como exemplo o artigo 3° do Anexo V do RICMS e o artigo 4°-A do Anexo VI do RICMS.


Dessa forma, fica demonstrado que em determinados momentos a legislação pode vedar o aproveitamento do crédito de ICMS relativo a qualquer entrada tributada (como exemplo, o disposto no inciso I do § 1° do artigo 4°-A do Anexo VI do RICMS); em outros, apenas os créditos fiscais relativos à operação beneficiada (como exemplo o parágrafo único do artigo 3° do Anexo V do RICMS); e existem, ainda, casos em que qualquer possível crédito de ICMS é vedado (nesse sentido, o inciso I do § 3° do artigo 1° da Portaria SEFAZ n° 079, de 30 de outubro de 2000, adiante transcrita).

Isso comprova o diferente grau de restrição à utilização de créditos de ICMS como contrapartida a regimes ou benefícios fiscais previstos ao longo da legislação tributária estadual.

Assim sendo, e já respondendo ao questionamento da consulente, quando alguma norma exige a renúncia ou veda a utilização de quaisquer créditos de ICMS, essa renúncia ou vedação alcança todos os créditos de ICMS possíveis de apropriação pelo contribuinte, ou seja, a interpretação do dispositivo deve ser literal.

Nesse mesmo sentido, aponta o inciso II do artigo 111 do Código Tributário Nacional (CTN), ao definir a utilização da interpretação literal para benefícios fiscais.
(Questionamento n° 2) se poderá se apropriar de forma proporcional ao crédito de ICMS referente as mercadorias exportadas.

Considerando existente a limitação à utilização de crédito conforme narrado pela consulente (lembrando que a consulente não juntou à presente consulta a norma ou o protocolo de intenções impondo a restrição, para que esta fosse analisada em específico), esta, como demonstrado, se aplica a todos os créditos de ICMS passíveis de apropriação pela consulente, inclusive aos inerentes à exportação.

Como já alinhavado, a natureza jurídica dos créditos relacionados à exportação é a mesma dos créditos comuns do ICMS.

Em seu âmago, são direitos disponíveis, postos à disposição do contribuinte para sua utilização, inclusive a renúncia.

Finalmente, incumbe ressalvar que, com a entrada em vigor do novo formato para a fruição de benefícios fiscais ao amparo da Lei Complementar n° 631/2019, a partir de 1° de janeiro de 2020, houve mudança quanto à forma de utilização dos créditos fiscais por beneficiários dos PRODEIC, cabendo ao contribuinte a observância da nova sistemática prevista no ordenamento jurídico vigente (v. §§ 1°, 2° e 3° do artigo 14 do Decreto n° 288/2019, que regulamentou a Lei n° 7.958/2003, que define o Plano de Desenvolvimento de Mato Grosso, em combinação com a citada Lei Complementar n° 631/2019), assim como em relação aos demais regimes ou benefícios fiscais, previstos na legislação mato-grossense, que o contribuinte utilize ou venha a utilizar e exijam restrições quanto ao aproveitamento de crédito fiscal de ICMS.

Cumpre ainda destacar que não produzirá os efeitos legais previstos no artigo 1.002 e no parágrafo único do artigo 1.005 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 2.212/2014, a consulta respondida sobre matéria que esteja enquadrada em qualquer das situações previstas nos incisos do caput do artigo 1.008 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n° 2.212, de 20 de março de 2014.

Alerta-se que, em sendo o procedimento adotado pela consulente diverso do aqui indicado, deverá, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, contados da ciência da presente, respeitado o quinquênio decadencial, regularizar suas operações, inclusive com recolhimento de eventuais diferenças de imposto, ainda sob os benefícios da espontaneidade, com acréscimo de correção monetária, juros e multa de mora, calculados desde o vencimento da obrigação até a data do efetivo pagamento.

Após o transcurso do prazo assinalado, ficará o estabelecimento consulente sujeito ao lançamento de ofício, para exigência de eventuais diferenças, nos termos do artigo 1.004 do RICMS/2014.

É a informação, ora submetida à superior consideração, com a ressalva de que os destaques apostos nos dispositivos da legislação transcrita não existem nos originais.

Coordenadoria de Redação, Divulgação e Interpretação de Normas da Receita Pública da Superintendência de Normas da Receita Pública, em Cuiabá – MT, 26 de agosto de 2020.

Flavio Barbosa de Leiros
FTE
DE ACORDO:
Yara Maria Stefano Sgrinholi
FTE
Coordenadora – CRDI
APROVADA.
José Elson Matias dos Santos
Superintendente de Normas da Receita Pública