Órgão Consultivo

Categoria: Informações em Processos de Consulta
Número:045/96-AT
Data da Aprovação:02/08/1996
Assunto:Reincidência
Decisão Adm.Transitada em Julgado


Nota Explicativa :
Nota: " Os documentos contidos nesta base de dados têm caráter meramente informativo. Somente os textos publicados no Diário Oficial estão aptos à produção de efeitos legais."

Texto
Senhor Secretário:

A servidora do fisco acima nominada, após discorrer que, no campo do Direito Penal, a caracterização da reincidência exige a existência de crime anterior, reconhecido em sentença já transitada em julgado, formula as questões infra, relativas à interpretação do termo na alínea “a” do inciso VIII do artigo 38 da Lei nº 5.419, de 27 de dezembro de 1988, observada a redação conferida pela Lei nº 5.902, de 19 de dezembro de 1991:

1) cabe a mesma interpretação no Direito Tributário?

2) para se saber se o contribuinte é reincidente, é necessário existir decisão administrativa transitada em julgado em processo anterior?

3) se o primeiro auto lavrado for julgado improcedente, ocorrera reincidência nas demais infrações?

4) o êxito das ações subseqüentes depende do resultado das ações anteriores?

Reza o dispositivo invocado:


“Art. 38 - O descumprimento das obrigações principal e acessórias, instituídas pela legislação do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS - fica sujeito às seguintes penalidades:

VIII- outras infrações:

a) não prestar informações solicitadas pelo fisco ou por qualquer meio causar embaraço, dificultar ou impedir a ação fiscalizadora - multa equivalente a 5 (cinco) UPFMT; na primeira reincidência, 10 (dez) UPFMT; na segunda reincidência, 50 (cinqüenta) UPFMT; nas demais, 100 (cem) UPFMT, sem prejuízo de qualquer outra penalidade cabível por infração a esta lei;

(...).” (Sem os negritos no original).


A clareza do artigo 46 do Código Penal brasileiro dispensa qualquer esforço para buscar o pressuposto necessário à caracterização da reincidência no âmbito do Direito Penal: sentença condenatória transitada em julgado pela prática de crime anterior, no período de 5 (cinco) anos entre a data daquela e a da nova infração.

A definição consagrada no Diploma repressivo pátrio não se afasta da compreensão leiga do vocábulo, oferecida pelo Dicionarista Aurélio Buarque de Holanda Ferreira:



A regra penal sustenta-se na repetição de ação delituosa, delimitando, ainda, os contornos de sua caracterização.

Não paira dúvida que o emprego do termo no dispositivo questionado, está, como num e noutro caso, vinculado à reiteração do ato, qual seja, o embaraço à fiscalização e assemelhados. Contudo, por se tratar de dispositivo que regula matéria alheia ao campo do Direito Penal, não cabe aplicar ao mesmo idênticos limites ao neste estabelecido.



Em que pese a dissociação do conceito nas esferas penal da tributária, não é raro esta utilizar o vocábulo com as feições inerentes àquela, adaptadas, todavia, às próprias peculiaridades.

A legislação do IPI, que tem na reincidência circunstância agravante da pena (artigo 351, § 1º, inciso I, do Regulamento do IPI, aprovado pelo Decreto nº 87.981, de 23 de dezembro de 1982), assim a define:

“Art. 353 - Caracteriza a reincidência a prática de nova infração de um mesmo dispositivo, ou de disposição idêntica, da legislação do imposto sobre produtos industrializados, ou de normas contidas num mesmo capítulo deste Regulamento, por uma mesma pessoa ou pelo sucessor referido no artigo 132, e parágrafo, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, dentro de cinco anos da data em que houver passado em julgado, administrativamente, a decisão condenatória referente à infração anterior.” (Foi destacado).

Ao contrário do que fez o legislador federal, o mato-grossense não se ocupou em esculpir o alcance do vocábulo, pois, ao utilizá-lo, outro conteúdo não quis lhe dar que não o de insistir o sujeito passivo na resistência de atendimento ao fisco.

A norma substantiva penal é de aplicação restrita às infrações penais, até mesmo por elementos que se exige na sua configuração (novo crime, sentença condenatória transitada em julgado por crime anterior).

Tanto é que a própria Lei das Contravenções Penais (Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941), que, desde logo, remete, em relação a estas, às normas gerais do Código Penal (artigo 10), houve por bem dar nova definição à reincidência:

“Art. 7º - Verifica-se a reincidência quando o agente pratica uma contravenção depois de passar em julgado a sentença que o tenha condenado, no Brasil ou no estrangeiro, por qualquer crime, ou, no Brasil, por motivo de contravenção.”


Se ações que estão a um degrau das abarcadas pelo Código Penal, exigiram definição especial, diversa daquela nele erigida, com muito mais razão, não pode a mesma transpor as divisas da legislação onde se inclui para disciplinar ações reguladoras na área tributária.

Na ausência de definição específica pela lei examinada, impõe-se que se compreenda o vocábulo com a conotação da linguagem corrente: repetição da infração.

Diante do exposto, conclui-se que para as lavraturas das sucessivas Notificações/Autos de Infração, não se exige a existência de trânsito em julgado da decisão administrativa relativa à anterior, já que as infrações, ainda que de mesma natureza, são múltiplas.

Contudo, exceto no que pertine à primeira ação fiscal, as penalidades previstas para as demais têm como pressuposto a prática da infração antecedente. Ruindo esta, modifica-se, quantitativamente, o montante das multas aplicadas às subseqüentes.

Desta forma, o êxito da ação fiscal não depende da anterior, mas a fixação do montante da multa, sim.

Assim sendo, recomenda-se que nas várias instâncias administrativas, o julgamento da infração posterior aguarde o deslinde da anterior, ficando, se for o caso, o processo sobrestado no Órgão julgador competente.

A medida, como pode parecer, não é protelatória. Ao contrário, revela antes economia processual.

O sobrestamento evitaria que ação fiscal mais recente tivesse sua procedência reconhecida, e, portanto, confirmada a multa majorada, anteriormente àquela que a precedeu, ao depois, julgada improcedente, na mesma instância.

Claro é que, após a caracterização da quarta infração ou terceira reincidência, a observância da sua seqüência perde importância, já que as multas permanecem invariáveis.

Por fim, forçoso é admitir que, em consonância com o entendimento esposado, a multa mais grave, pela reincidência, aplica-se quando não atendida idêntica solicitação no mesmo procedimento fiscal. Neste sentido, é irrelevante, na fixação da pena, que em procedimentos anteriores tenham sido lavrados os chamados auto de embaraço.

É a informação que ora se submete à superior consideração, acrescentando-se que, em sendo aprovada, devem ser remetidas cópias, para conhecimento e providências, à Unidade de Julgamento de Processos Administrativos Tributários e ao Egrégio Conselho de Contribuintes do Estado de Mato Grosso.


Cuiabá-MT. 29 de janeiro de 1996.


Yara Maria Stefano Sgrinholi
FTE
De acordo:
José Carlos Pereira Bueno
Assessor Tributário




(1) FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 1. ed. (11º imp), Rio de Janeiro: Nova Fronteira. p. 1.209.
(2) Idem, ibídem
(3) SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. 4v. p.80.