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NOTA TÉCNICA N° 017/2025- UDCR/UNERC
Ementa:ICMS - OBRIGAÇÃO PRINCIPAL – BENEFÍCIO FISCAL - CESTA BÁSICA - ART. 1º, ANEXO V, DO RICMS - PRODUTO DESTINADO A USO DIVERSO DO PREVISTO NA NORMA CONCESSIVA – NÃO APLICAÇÃO.

Integram a cesta básica, para os fins do art. 1º, Anexo V, do RICMS, as mercadorias que atendam as seguintes condições: 1) estejam previstas nos incisos I e II do art. 1º, do Anexo V, do RICMS; 2) sejam destinadas a alimentação humana; e 3) estejam acondicionadas em embalagens destinadas, expressa ou implicitamente, ao consumo final por indivíduos ou famílias.

A presente Nota Técnica objetiva fornecer orientação quanto à interpretação do art. 1º, Anexo V, do RICMS, especialmente quanto à aplicação do benefício de redução da base de cálculo do imposto às operações com mercadorias que, embora previstas no texto normativo, sejam destinadas a fins estranhos ao estabelecido na norma (cesta básica), nos termos do art. 56, inciso VIII, do Regimento Interno da Secretaria de Estado de Fazenda, aprovado pelo Decreto nº 729/2024.

1. DO ÂMBITO DE APLICAÇÃO DO BENEFÍCIO DE REDUÇÃO DE BASE DE CÁLCULO EM OPERAÇÕES COM MERCADORIAS INTEGRANTES DA CESTA BÁSICA (ART. 1º, ANEXO V, RICMS)

O Convênio ICMS 128/94, celebrado no âmbito do CONFAZ, dispõe sobre tratamento tributário para as operações com as mercadorias que compõem a cesta básica. O convênio autoriza STF, Plenário, ADI 5.929 / DF, Rel. Min. Edson Fachin. Julgamento em 14/02/2020. Publicação em 06/03/2020. os Estados e o Distrito Federal a estabelecerem carga tributária mínima do ICMS de 7% (sete por cento) nas saídas internas de mercadorias que compõem a cesta básica. O convênio não enumera os produtos que compõem a cesta básica, atribuindo aos entes federados a prerrogativa de fazê-lo segundo suas particularidades regionais (sociais, econômicas e políticas).

O RICMS internalizou o benefício fiscal previsto no Convênio ICMS 128/94 por meio do art. 1º de seu Anexo V, que disciplina as operações e prestações alcançadas por redução de base de cálculo. Transcreve-se o dispositivo:

O texto normativo separa as mercadorias em dois grupos. No primeiro grupo se encontram as mercadorias que estão sujeitas à alíquota interna de 17%. No segundo grupo estão as mercadorias sujeitas à alíquota interna de 12%. Os fatores de redução de base de cálculo estão definidos para que a carga tributária sobre as operações seja de 7%, em atenção ao disposto no Convênio ICMS 128/94.

Da legislação transcrita se depreende que o benefício tem aplicação restrita às operações internas, não se aplicando às entradas ou saídas interestaduais. Por consequência, não se aplica ao ICMS diferencial de alíquotas devido ao Estado de Mato Grosso nas entradas interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do ICMS.

O texto normativo, caput e incisos, estabelece o benefício de redução de base de cálculo do ICMS para as operações com as mercadorias que arrola, sem repetir o atributo especificador (“mercadorias integrantes da cesta básica”) expresso na epígrafe do capítulo em que está inserido.

Esse caractere delimitador das mercadorias que fazem jus ao tratamento tributário favorecido também está expresso na ementa do Convênio ICMS 128/94, que está assim redigida: “Dispõe sobre tratamento tributário para as operações com as mercadorias que compõem a cesta básica.”

Bem por isso, considerando a finalidade para a qual foi instituído, o benefício fiscal previsto no art. 1º, do Anexo V, do RICMS, tem aplicação restrita às mercadorias que integram a cesta básica. Assim, mercadorias que possam se enquadrar na descrição abstrata do texto normativo, mas que sejam destinadas a outros fins, como produção agropecuária, industrialização ou prestação de serviços, não são beneficiárias do tratamento favorecido.

A interpretação do texto normativo e a construção da norma jurídica devem considerar não apenas o plano do enunciado textual, mas também as demais dimensões do processo de interpretação do Direito. Além do texto (plano da expressão da norma), o intérprete deve investigar o conjunto dos conteúdos de significação dos enunciados (plano do conteúdo), a norma jurídica em sua estrutura hipotética-implicacional (plano normativo), e os vínculos de coordenação e subordinação que estabelece com as demais unidades normativas do sistema (plano do Sistema Jurídico) CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 11. Ed. São Paulo: Noeses: 2021. pp.85-110..

O texto normativo é apenas um dos elementos da norma jurídica e deve ser necessariamente integrado ao sistema de que faz parte. Mais especificamente, a compreensão do sentido de um texto de lei passa naturalmente pela compreensão do sentido do capítulo em que está inserido.

Nesse processo não há como desprezar a finalidade da norma, que compõe, de forma indissociável, seu sentido e alcance. Ignorar a finalidade da norma, elegendo outra em seu lugar, ainda que de modo não declarado, corresponde a estabelecer norma diversa daquela interpretada e validada no ordenamento jurídico.

Não se ignora que o Código Tributário Nacional, em seu art. 111, determina que a legislação tributária que disponha sobre outorga de isenção O benefício fiscal de redução de base de cálculo é uma espécie de isenção parcial. seja interpretada literalmente. Nesse ponto, quer dizer o Código que não é possível que a norma concessiva do benefício seja estendida para casos não previstos no texto normativo, sob o argumento de que o fato previsto e o fato não previsto em lei sejam similares e demandem idêntico tratamento jurídico. Em outras palavras, o que o Código proíbe é que determinado evento, constitutivo de obrigação tributária, seja favorecido sem previsão legal expressa nesse sentido, por meio do uso da analogia.

Não há no art. 111 do CTN qualquer pretensão de impor intepretação das normas tributárias sem tomar em conta a sua finalidade. Até porque valores e fins são elementos indissociáveis da estrutura das normas jurídicas. Como se disse, opor-se à finalidade enunciada da norma equivale a aceitar, ainda que de forma não declarada, finalidade estranha ao sistema jurídico, e, por consequência, chegar a unidade normativa diversa da pretendida pelo legislador.

A previsão do Código se dá porque a obrigação tributária é formada por crédito de natureza pública, sujeito ao princípio da indisponibilidade do interesse público. Somente o titular desse interesse (o povo) pode, por meio de lei, abrir mão de parcela do crédito tributário.

Desse modo: o benefício previsto no art. 1º, do Anexo V, do RICMS, somente se aplica para operações com mercadorias integrantes da cesta básica. O benefício não terá aplicação quando a mercadoria for destinada a outro fim, como produção agropecuária ou outra atividade econômica. No sentido aqui defendido, citam-se manifestações anteriores desta Unidade e das que a precederam:

Ø Informação 021/2007-GCPJ/CGNR
Ø Informação 111/2009 - GCPJ/SUNOR
Ø Informação 061/2020 - GCPJ/SUNOR
Ø Informação 189/2020 – CRDI/SUNOR
Ø Informação 214/2020 – CRDI/SUNOR
Ø Informação 262/2020 – CRDI/SUNOR
Ø Informação 015/2021 – CRDI/SUNOR
Ø Informação 113/2021 – CDCR/SUCOR
Ø Informação 298/2022–CDCR/SUCOR
Ø Informação 098/2023 – UDCR/UNERC

Ainda em caráter exemplificativo, citam-se os seguintes trechos elucidativos:

Informação 111/2009 - GCPJ/SUNOR
“Assim sendo, extrai-se da leitura do artigo acima transcrito, bem como dos comandos do aludido Convênio ICMS 128/94, que na hipótese da margarina vegetal ser acondicionada em embalagem e quantidade característica de uso industrial não estará beneficiada com a redução de base de cálculo.”

Informação 214/2020 – CRDI/SUNOR
“Portanto, o óleo de coco (NCM 1513.19.00) e o azeite de abacate (NCM 1515.90.90), quando destinados à alimentação humana e, ainda, desde que acondicionados em embalagens destinadas ao consumidor final, fazem parte da cesta básica definida pela legislação tributária para fins de aplicação da regra minudente do ICMS no Estado de Mato Grosso.”

Informação 098/2023 – UDCR/UNERC
“Desse modo, em resposta ao questionamento da consulente, informa-se que os produtos sal grosso e o sal refinado classificados no código NCM 2501.00.20, quando destinados à alimentação humana e, ainda, desde que acondicionados em embalagens destinadas ao consumidor final, fazem parte da cesta básica definida pela legislação tributária para fins de aplicação da regra minudente do ICMS no Estado de Mato Grosso, ou seja, a redução de base de cálculo prevista no artigo 1°, inciso I, alínea “k” do Anexo V do RICMS/MT.”

A interpretação apresentada nesta Nota Técnica, portanto, apenas consolida o entendimento que esta SEFAZ tem manifestado há quase duas décadas em reiteradas informações. Superado esse ponto, investiga-se adiante o sentido e o alcance do termo “cesta básica”, que qualifica a destinação das operações beneficiadas com a redução da base de cálculo do imposto.

2. DA CESTA BÁSICA

O Decreto-Lei nº 399/1938, ainda vigente, estabeleceu uma lista de provisões necessárias à alimentação diária do trabalhador adulto. Essa previsão serve de referência para o cálculo do custo da cesta básica realizado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE).

Segundo “metodologia da cesta básica de alimentos” do DIEESE Disponível em https://www.dieese.org.br/metodologia/metodologiaCestaBasica.pdf, cesta básica é um conjunto de produtos alimentícios suficiente para atender às demandas nutricionais básicas de uma família composta por dois adultos e duas crianças, durante um mês.

O custo mensal com alimentação obtido na pesquisa da cesta básica é usado para o cálculo do salário mínimo que atenda o previsto no art. 7º, inciso IV, da Constituição Federal, segundo o qual o salário mínimo deve ser capaz de atender às necessidades vitais básicas do trabalhador e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social.

Conjugadas essas disposições, entende-se a cesta básica, para fins fiscais, como um conjunto de mercadorias destinadas à alimentação humana que sejam necessárias e suficientes para atender às demandas nutricionais vitais de uma família, durante um mês. Por se referir à alimentação suficiente para satisfazer as necessidades vitais básicas do indivíduo e de sua família, a cesta básica recebe tratamento tributário favorecido, em homenagem à diretriz da seletividade, de que trata o art. 155, §2º, III, da Constituição Federal.

Assim, é natural que as mercadorias integrantes da cesta básica sejam aquelas destinadas ao consumo das famílias, o que afasta produtos acondicionados em embalagens e quantidades características de uso agropecuário, industrial ou comercial.

A destinação ao consumo das famílias deve ser identificada principalmente pela forma de acondicionamento da mercadoria. Mercadorias com embalagens que prevejam expressamente a destinação do produto para uso industrial (ou outro diverso do consumo familiar) estarão fora do tratamento favorecido. Não havendo previsão expressa na embalagem, a quantidade de produto por embalagem será o elemento determinante de sua destinação.

O DIEESE reconstrói a tabela de provisões mínimas do Decreto-Lei nº 399/1938 em sua Metodologia da Cesta Básica de Alimentos. A tabela abaixo indica as provisões mínimas necessárias ao atendimento das necessidades básicas com alimentação de um trabalhador, durante um mês:


Tabela: Tabela de provisões mínimas estipuladas pelo Decreto Lei n° 399/1938, reconstruída pelo DIEESE Disponível em https://www.dieese.org.br/metodologia/metodologiaCestaBasica.pdf. O Estado de Mato Grosso encontra-se classificado na Região 3.

Esta Nota Técnica não tem pretensão de indicar quantidades exatas dos produtos arrolados no art. 1º, Anexo V, do RICMS, para fins de aplicação do benefício fiscal. O enquadramento (ou não) da operação relativa à circulação de mercadoria na hipótese de aplicação do benefício terá que ser feito caso a caso. A despeito disso, a tabela acima constitui importante referência para auxiliar contribuintes e a Administração Tributária nessa tarefa, devendo ser tomado em conta que: as quantidades nela indicadas se referem ao consumo mensal de um indivíduo; as famílias podem se apresentar em diversas estruturas, mais ou menos numerosas; os hábitos alimentares das famílias não são uniformes; as quantidades se destinam a atender necessidades vitais básicas do indivíduo.

Os usos e costumes do comércio também são uma importante referência de investigação da destinação das mercadorias. Historicamente, determinadas mercadorias se apresentam em embalagens variadas no comércio de produtos alimentícios, a depende do seu público alvo. Algumas sabidamente são destinadas ao uso e consumo por agentes econômicos no exercício de seu objeto social, enquanto outras são destinadas ao consumo final por indivíduos e famílias.

Nesse contexto, só devem ser excluídas da aplicação do benefício fiscal as operações com mercadorias cujas embalagens indiquem expressamente destinação diversa do consumo familiar, ou as operações com mercadorias cujas quantidades por embalagem destoem de forma relevante do padrão de consumo familiar, com embalagem típica de uso agropecuário, industrial, comercial ou outro com finalidade econômica.

3. CONCLUSÃO

Na aplicação do benefício fiscal de redução da base de cálculo do ICMS previsto no art. 1º, do Anexo V, do RICMS, deve ser levado em consideração o quanto exposto na epígrafe do Capítulo I, do Anexo V, do RICMS, e a ementa do Convênio ICMS 128/94, que especificam que o tratamento tributário favorecido se destina às mercadorias integrantes da cesta básica.

Cesta básica, para fins fiscais, é o conjunto de mercadorias destinadas à alimentação humana necessárias para atender às demandas nutricionais vitais de uma família, durante um mês. As mercadorias integrantes da cesta básica são aquelas destinadas ao consumo das famílias, o que afasta produtos acondicionados em embalagens e quantidades características de uso agropecuário, industrial ou comercial.

A destinação ao consumo das famílias deve ser identificada principalmente pela forma de acondicionamento da mercadoria. Devem ser excluídas da aplicação do benefício fiscal as operações com mercadorias cujas embalagens indiquem expressamente destinação diversa do consumo familiar, ou as operações com mercadorias cujas quantidades por embalagem destoem de forma relevante do padrão de consumo familiar, mediante uso de embalagens típicas de uso agropecuário, industrial, comercial ou outro com finalidade econômica.

A Tabela de Provisões Mínimas estipulada pelo Decreto Lei n° 399/1938 e reconstruída pelo DIEESE em sua Metodologia da Cesta Básica de Alimentos e os usos e costumes do comércio são referências importantes para investigação do padrão de consumo alimentar das famílias.

Integram a cesta básica, para os fins do art. 1º, Anexo V, do RICMS, as mercadorias que atendam as seguintes condições: 1) estejam previstas nos incisos I e II do art. 1º, do Anexo V, do RICMS; 2) sejam destinadas a alimentação humana; e 3) estejam acondicionadas em embalagens destinadas, expressa ou implicitamente, ao consumo final por indivíduos ou famílias.

Esta Nota Técnica consolida o entendimento que esta SEFAZ tem manifestado em reiterados processos de Consulta Tributária.

É o que cabia informar. À superior consideração.

Unidade de Divulgação e Consultoria de Normas da Receita Pública da Unidade de Uniformização de Entendimentos e Resolução de Conflitos, em Cuiabá/MT, 26 de fevereiro de 2025.
Adalto Araújo de Oliveira
Fiscal de Tributos Estaduais

DE ACORDO
Elaine de Oliveira Fonseca
Chefe de Unidade – UDCR/UNEC (em substituição)

APROVADA
Erlaine Rodrigues Silva
Chefe da Unidade de Uniformização de Entendimentos e Resolução de Conflitos