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NOTA TÉCNICA N° 046/2024- UDCR/UNERC

Ementa:ICMS – AQUISIÇÃO INTERESTADUAL – CONSUMO FINAL – DIFERENCIAL DE ALÍQUOTAS – ADQUIRENTE NÃO CONTRIBUINTE.

A Lei n° 10.337/2015, editada após a promulgação da EC n° 87/2015 e antes da entrada em vigor da Lei Complementar n° 190/2022, com o propósito de instituir o ICMS Diferencial de Alíquotas nas operações destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto, é válida, apenas seus efeitos se iniciaram a partir da vigência da LC n° 190/2022 (Tema 1.094 do STF).

A sistemática do Diferencial de Alíquotas resguarda a determinação da não-cumulatividade do tributo, tendo em vista que o contribuinte recolhe, no Estado de destino, apenas a diferença entre a alíquota interestadual e a alíquota interna, sendo esta uma parcela de um único tributo devido sobre uma mesma operação, cujo recolhimento foi dividido entre dois entes federados, sendo que, na apuração da parcela devida ao estado de origem, os créditos relativos às operações anteriores foram devidamente aproveitados


A presente Nota Técnica visa esclarecer aspectos da exigência do ICMS a título de diferencial de alíquotas nas aquisições interestaduais por consumidor final não contribuinte do ICMS para fins de defesa do Estado de Mato Grosso em processos judiciais que discutem a respectiva cobrança.

Serão abordadas as seguintes alegações:

1) ausência de lei estadual instituindo o ICMS Diferencial de Alíquotas no Estado de Mato Grosso após a publicação da Lei Complementar n° 190/2022, por inexistência no ordenamento jurídico brasileiro da figura da constitucionalização superveniente;

2) incompatibilidade da legislação estadual que institui o ICMS a título de diferencial de alíquotas no Estado de Mato Grosso com a posterior Lei Complementar n° 190/2022;

3) ausência de um "Portal do DIFAL" que atenda a todos os requisitos estabelecidos na Lei Complementar n° 190/2022;

4) violação ao princípio da não-cumulatividade, uma vez que o artigo 20-A da Lei Complementar n° 190/2022 limita o aproveitamento de créditos do ICMS, ofendendo o conteúdo mínimo do referido princípio;

5) violação à não discriminação de destino, isonomia e à livre concorrência, pois a regra prevista no art. 20-A da Lei Complementar n° 87/96, inserida pela Lei Complementar n° 190/2022, onera indevidamente os contribuintes que realizam operações interestaduais, em detrimento daqueles que só realizam operações internas.

Passa-se a análise da matéria.

(1)

Como é notório em 17 de abril de 2015 foi publicada a Emenda Constitucional n° 87/2015, que alterou os incisos VII e VIII do § 2° do artigo 155 da Constituição Federal, nos seguintes termos:


A Emenda Constitucional n° 87/2015 conferiu nova redação aos incisos VII e VIII do § 2° do artigo 155 da Constituição Federal de 1988, a fim de que nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, ainda que não contribuinte do imposto, localizado em outro Estado, também seja adotada a alíquota interestadual, cabendo ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do estado destinatário e a alíquota interestadual.

No âmbito do Estado de Mato Grosso, as disposições da Emenda Constitucional n° 87/2015 foram internalizadas pela Lei n° 10.337, de 16 de novembro de 2015, que alterou a Lei n° 7.098/98.

No entanto, a matéria foi submetida ao Supremo Tribunal Federal – STF que, no julgamento do RE 1.287.019 e da ADI 5.469, realizado em 24 de fevereiro de 2021, reconheceu a necessidade de edição de lei complementar para regular, em âmbito nacional, a cobrança estabelecida pela EC n° 87/2015, fixando a seguinte tese (Tema 1.093):
Ao modular os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, o STF, decidiu, por maioria, o que segue:
Com relação à modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, é importante registrar que as leis estaduais e do Distrito Federal, que foram editadas após a promulgação da Emenda Constitucional n. 87/2015, tiveram sua validade suspensa até que fosse publicada a lei complementar regulamentadora da matéria. Dessa forma, tais leis foram declaradas ineficazes, e não inconstitucionais.

Inclusive, esse foi o entendimento do STF no julgamento do Tema 1.094 que, de modo análogo, analisou a “incidência do ICMS na importação de bens e mercadorias por pessoa física ou jurídica com base em lei estadual editada posteriormente à promulgação da EC n° 33/2001, porém antes da vigência da Lei Complementar Federal n° 114/2002”, cuja tese fixada foi:
Ademais, no julgamento do Tema 1.093, ora debatido, o Min. Dias Toffoli, relator para o acórdão, enfatizou a validade das leis estaduais e distritais que, editadas antes da lei complementar federal, dispunham sobre a cobrança do imposto em tela, evocando citada tese fixada no Tema 1.094. Veja-se:
Assim, em atendimento à decisão do STF, foi publicada a Lei Complementar Federal n° 190/2022, alterando a Lei Complementar n° 87, de 13 de setembro de 1996 (Lei Kandir), com o intuito de regulamentar a cobrança do ICMS nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidores finais não contribuintes do imposto.

Nesse contexto, a Lei Estadual n° 10.337/2015, que introduziu na Lei Estadual n° 7.098/98 a cobrança do ICMS Diferencial de Alíquotas na hipótese de destinatário consumidor final não contribuinte, é válida; haja vista que apenas sua eficácia estava condicionada à publicação de lei complementar federal, condição essa que foi superada com a Lei Complementar n° 190/2022.

Portanto, desnecessária a publicação de nova lei, uma vez que o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a validade das leis estaduais, pois apenas a eficácia delas estava atrelada à norma federal.

Assim, a Lei Complementar n° 190/2022 passou a dar eficácia a Lei Estadual n° 7.098/98, alterada pela Lei Estadual n° 10.337/2015, tornando descabida, apenas em razão de questão temporal, a edição de nova norma com idênticos termos jurídicos, redação e pressupostos da norma anterior.

Ressalta-se que a constitucionalidade superveniente envolve parâmetros materiais e substanciais da norma e não situações de eficácia.

Ante o exposto, não subsiste a alegação de ausência de lei estadual instituindo o ICMS devido a título de diferencial de alíquotas no Mato Grosso após a publicação da Lei Complementar n° 190/2022.

(2)

Do mesmo modo, não há incompatibilidade entre a legislação estadual e a Lei Complementar n° 190/2022, pois a "entrada física" é o critério adotado pelo Estado de Mato Grosso para a exigibilidade do tributo a título de diferencial de alíquotas. Veja-se o § 10 do artigo 71 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n° 2.212/2014:

Ademais, a regra prevista no § 7° do artigo 11 da Lei Complementar n° 87/96, apenas define o critério para determinar a competência tributária ativa para exigir o ICMS Diferencial de Alíquotas nas operações em que fornecedor, adquirente e destinatário físico da mercadoria estejam situados em três Estados distintos, não sendo elemento de reprodução obrigatória na lei instituidora do tributo.

(3)

Com relação à necessidade de uma ferramenta de apuração centralizada e emissão de guias de recolhimento do ICMS Diferencial de Alíquotas (DIFAL), o Portal do DIFAL foi instituído pelo Convênio ICMS 235, de 27/12/2021, e está disponível na internet, podendo ser acessado no endereço eletrônico https://dfe-portal.svrs.rs.gov.br/Difal/.

Inclusive, a página eletrônica da SEFAZ/MT, que pode ser encontrada no Portal Nacional, disponibiliza calculadora virtual para a apuração do ICMS Diferencial de Alíquotas e para emissão de Nota Fiscal nas operações destinadas a consumidor final mato-grossense não contribuinte do imposto (https://www.portaldoconhecimento.mt.gov.br/calculadora-nao-contribuinte ).

Ainda, o Portal Nacional do DIFAL, previsto no art. 24-A, § 2°, da LC 87/96, visa somente facilitar o procedimento de cálculo do valor a ser recolhido a título de DIFAL de ICMS, de modo que a falta de aprimoramento do aludido Portal não inviabiliza o recolhimento do imposto.

(4)

No tocante à alegação de violação ao princípio da não-cumulatividade, veja-se o que dispõe o artigo 20-A da Lei Complementar n° 87/96, com a redação dada pela Lei Complementar n° 190/2022:

Nesse contexto, vislumbra-se que a EC n° 87/2015 equiparou as operações interestaduais feitas entre contribuintes com as operações que destinem bens a não-contribuintes localizados em outro estado, para fins de aplicação da alíquota interestadual do ICMS e sua repartição entre os estados envolvidos.

Logo a sistemática do Diferencial de Alíquotas resguarda a determinação da não-cumulatividade do tributo, tendo em vista que o contribuinte recolhe, no Estado de destino, apenas a diferença entre a alíquota interestadual e a alíquota interna, sendo esta uma parcela de um único tributo devido sobre uma mesma operação, cujo recolhimento foi dividido entre dois entes federados, sendo que, na apuração da parcela devida ao estado de origem, os créditos relativos às operações anteriores foram devidamente aproveitados.

Ressalta-se, que em todas as operações interestaduais o aproveitamento dos créditos das operações anteriores pelo remetente está limitado ao montante correspondente à alíquota interestadual devido ao estado de origem, não é diferente nas operações destinadas à consumidor final não contribuinte em que é devido o ICMS Diferencial de Alíquotas.

Veja-se que o princípio estampado no inciso I do § 2° do artigo 155 da Constituição Federal, prega que o ICMS será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal.

Ora a operação sobre a qual se exige o ICMS a título de diferencial de alíquotas, é a mesma operação sobre a qual incidiu o ICMS devido ao Estado de localização do remetente, de modo que não há que se falar em oneração na operação posterior, haja vista se tratar de uma única operação, cujo aproveitamento dos créditos ocorreu, como nas demais operações interestaduais, na parcela do imposto devida ao estado de origem.

Ademais a operação sujeita ao recolhimento do ICMS Diferencial de Alíquotas é somente aquela destinada a consumidor final, ou seja, a última operação na cadeia econômica da mercadoria, não havendo mais que se falar em efeito cascata do imposto.

(5)

Por fim, quanto à violação aos princípios da não discriminação de destino, isonomia e à livre concorrência em decorrência da alegada violação ao princípio da não-cumulatividade, afastada essa, não há o que discorrer sobre aquela.

É a informação que ora se submete a superior consideração.

Unidade de Divulgação e Consultoria de Normas da Receita Pública da Unidade de Uniformização de Entendimentos e Resolução de Conflitos, em Cuiabá/MT, 19 de agosto de 2024.




Damara Braga Almeida dos Santos
FTE

De acordo:

Elaine de Oliveira Fonseca
Chefe de Unidade – UDCR/UNERC (em exercício)